segunda-feira, 26 de abril de 2021

Alice (parte dois)

Alice agarrou-se ao que conhecia, afim de não perder-se no universo de existências. Havia aceitado seu destino: iria morrer. Mas algo aconteceu, que nossa pequena não soube explicar para todas as milhões de pessoas que a indagaram: até que ponto você se desfez e pôde retornar? Não soube dizer, mas sentia. Profundamente, claramente, sentia. E isso bastava para provar que permanecia, que tinha significação; que no fim, ainda tinha a sua existência. Seus diversos mundos ainda eram atrativos a ela, mas estavam diferentes. Até que ponto a jovem conseguiria suportar novamente o peso em suas costas? Não poderia assumir novamente esse compromisso, não depois do que sentiu em sua pele. E agora, marcada pelo tempo, se questionava os porquês de ainda permanecer.

Tudo era muito confuso para Alice. Tinha um universo inteiro à sua disposição, mas não havia coragem alguma para decidir o que queria, e isso a assustava. O mundo pertence aos corajosos, pensava, e questionava de si para si onde poderia fincar raízes. Apesar de tudo que viveu, nossa menina ainda queria pertencer. Precisava, com todas suas forças, construir o que viria a chamar de seu pequeno espaço no mundo. Achava que, se ocupasse muito espaço, incomodaria a todos. E por isso, novamente aceitava a sua pequenez, escolhendo se encaixar da maneira que fosse, pra não se perder novamente. 

As vozes ainda estavam ali, à espreita de um tropeço no caminho de Alice, para tomar conta de si novamente. Esse processo era inconsciente a algum tempo e mesmo assim, a menina não havia se acostumado. Seu mundo seguia sendo vários, pois não conseguia (não queria) estabelecer um rumo certo. E permitia que seus diversos eus tomassem a frente, por falta de opção. No fundo, ela gostaria que as coisas fossem mais simples. Mas pra quem tem o coração em pedaços, nunca é. Alice sentia demais, e por isso permanecia, sem necessariamente permanecer. Tudo ainda era muito confuso, e Alice aceitou a confusão. Abraçou-a para não ser engolida pelo furacão de sentimentos que a arrebatava todas as vezes, todos os dias. A confusão faz bem, pensava, porque eu preciso dela como prova. Prova de quê, não sabia dizer, mas a certeza que tinha era da necessidade de provar. 

Alice não morreu. E não soube dizer o porque. Talvez porque havia algo dentro dela lutando para reaparecer. Não sabia quem venceria essa batalha, mas queria, por teimosia, que sua luz vencesse. E pra isso, queria encher seu coração de chamas. Mas faltavam-lhe forças para riscar o fósforo.


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